sábado, 22 de agosto de 2015

A Epistemologia genética na perspectiva do Jean Piaget



A Epistemologia genética na perspectiva do Jean Piaget
A Epistemologia genética defende que o indivíduo passa por várias etapas de desenvolvimento ao longo da sua vida. Para Piaget, a aprendizagem é um processo que começa no nascimento e acaba na morte. A aprendizagem dá-se através do equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, resultando em adaptação. Segundo este esquema, o ser humano assimila os dados que obtém do exterior, mas uma vez que já tem uma estrutura mental que não está "vazia", precisa adaptar esses dados à estrutura mental já existente. Uma vez que os dados são adaptados a si, dá-se a acomodação. Para Piaget, o homem é o ser mais adaptável do mundo. Este esquema revela que nenhum conhecimento nos chega do exterior sem que sofra alguma alteração pela nossa parte, ou seja, tudo o que aprendemos é influenciado por aquilo que já tínhamos aprendido.
De acordo com as possibilidades de entendimento construídas pelo sujeito, ele tende a assimilar idéias, mas, caso estas estruturas não estejam ainda construídas, acontece um esforço contrário ao da assimilação. Há uma modificação de hipóteses e concepções anteriores que vão ajustando-se àquilo que não foi possível assimilar.   É o que ele chama de acomodação, onde o sujeito age no sentido de transformar-se em função das resistências colocadas pelo objeto do conhecimento. O desequilíbrio é portanto fundamental, pois, o sujeito buscará novamente o reequilíbrio, com a satisfação da necessidade, daquilo que ocasionou o desequilíbrio.
A inteligência para Piaget se constrói na medida em que novos patamares de equilíbrio adaptativo são alcançados. Piaget concluiu sua obra explicitando qual o motor pelo qual este equilíbrio se processa, mas além disto, Piaget estudou exaustivamente a gênese das estruturas cognitivas nas crianças da sua comunidade.  Piaget aborda a inteligência como algo dinâmico, que decorre da construção de estruturas de conhecimento que, enquanto vão sendo construídas, vão se instalando no cérebro. A inteligência portanto, não aumenta por acréscimo e sim por reorganização.  Para ele o desenvolvimento da inteligência é explicada pela relação recíproca existente com a gênese da inteligência e do conhecimento. Piaget criou um modelo epistemológico com base na interação sujeito - objeto.  Pelo modelo epistemológico o conhecimento não está nem no sujeito, nem no objeto, mas na interação entre ambos. (isso é muito importante, é a idéia central de sua obra)
B) CONCEITOS IMPORTANTES EM SUA OBRA:
Esquemas: seqüências bem definidas de ações física ou mental (ex.: sucção, sacudir)
Princípios gerais (pilares de sustentação do desenvolvimento cognitivo de todos os estágios):
- Organização: envolve a interação de todos os processos em um sistema global (ex.: segurar e olhar o brinquedo ao mesmo tempo). Tendência a criar sistemas que agrupam todo o conhecimento sobre o mundo.
- Adaptação: ajustamento ao meio ambiente, equilíbrio entre acomodação e assimilação. (Ex.: jogo simbólico).
- Assimilação: incorporação de novos objetos e experiências a esquemas existentes (ex.: bico do seio / bico da mamadeira / chupeta)
- Acomodação: modificações de esquemas como resultados de novas experiências, ou seja: mudanças em estruturas cognitivas existentes
- Equilibração: esforço para conseguir equilíbrio cognitivo.

Cada criança tem um comportamento adaptativo porque ela modifica os esquemas em respostas ao ambiente. Na infância as atividades motoras dão origem a pensamentos (operações mentais).Analisando os períodos descritos por Piaget podemos concluir que existe uma lei de desenvolvimento que determina toda a evolução do indivíduo. O desenvolvimento é uma equilibração progressiva, uma passagem contínua de um estado  menor de equilíbrio para um estado de equilíbrio superior, onde cada estágio é caracterizado pela aparição de estruturas originais, cuja construção o distingue dos estágios anteriores.
Piaget e a teoria dos estágios cognitivos (Operacional Concreto e Formal):

C) Pensamento operacional concreto (7 a 11 anos):

A criança pode raciocinar logicamente sobre coisas e eventos que elas percebem.
Entre 7 e 11 anos entendem princípios lógicos e os aplicam às situações concretas (visíveis e reais).
Tornam-se pensadores mais sistemáticos, objetivos, científicos (e  educáveis).
Pré-operatório: intuição e percepção = “talvez a lagarta tenha sentido vontade de virar borboleta” Percepção subjetiva.
Operacional: explicações racionais, coerentes e generalizações “Será que a lagarta usa a temperatura do ar para saber que é o momento de começar a sair do casulo?”
Pré-operatório: perguntam “por que” mas rejeitam respostas que não gostam.
Operacional: “por que” e quer saber.
Usam regras de jogo (discutem regras)

Três princípios lógicos:
- Identidade
- Reversibilidade
- Reciprocidade

Operações Concretas: as crianças desenvolvem a capacidade de pensar logicamente sobre o aqui e agora, mas não sobre abstrações.
Este período recebe o nome de “operações concretas” porque as ações físicas passam a ser interiorizadas (ocorrem mentalmente).
            [no período anterior precisava da ação física para elucidar o problema proposto]
            [neste período, a criança olha e mentalmente resolve o problema]

. Declínio do egocentrismo intelectual
- Crescente incremento do pensamento lógico
-formação de esquemas conceituais (verdadeiramente mentais)
-a realidade passa a ser estruturada pela razão
-julgamento conceitual (não depende da percepção):
. conservação
. reversibilidade (pode reverter uma transformação) = descentralização
. há, portanto, “agrupamento” (sistemas).

 “agrupamento” (Piaget):
- organização lógica entre os elementos (relações reversíveis)
-          leis que organizam e regulamentam a utilização dos esquemas conceituais (adquirem coerência). 

. A tendência lúdica do pensamento [real e fantástico se misturavam] é substituída por uma atitude crítica (ou seja: há necessidade de explicar logicamente suas idéias e ações, não tolerando mais contradições no pensamento)
. Compreensão lógica e adequada da realidade (percebe-se como indivíduo entre outros: um elemento de um universo que passa a ser estruturado pela razão).
. Há declínio da linguagem egocêntrica (até paulatinamente seu desaparecimento). A linguagem se torna então socializada.
. O desenvolvimento social (é paralelo) e significativo:
percebe que outras pessoas tem pensamentos, sentimentos e necessidades diferentes dos seus.
. Flexibilidade mental – entende regras de jogos.
. Julgamentos morais: tendência para interiorização: as intenções do sujeito passam a ser consideradas.
Limite: as operações realizadas se referem a objetos que existem completamente na realidade.
Os estímulos para o desenvolvimento intelectual está na vida cotidiana: o jogo simbólico é coletivo (tentativa de representar a realidade)
-          ligação forte com o real
-          evolução dos jogos – 7/9 anos : seguem as regras aprendidas
                                       10/11 anos: consentem em mudar as regras
-   grupo de amigos : caracterização – presença do mesmo sexo (aprendizagem de ser  homem e mulher) / cooperação genuína, trocas de idéias.

Pensamento: um dos aspectos centrais da adaptabilidade do homem ao meio.
Inteligência é “Uma organização adaptativa, cuja função consiste em estruturar um universo tal como o organismo estrutura o meio imediato”
-          sua natureza é evolucionária.
-          “equilibração progressiva, passagem contínua de um estado menor de equilíbrio para outro de equilíbrio superior” (Piaget)
-          “a vida é, sem dúvida, uma criação contínua de formas cada mais complexas e o estabelecimento de um equilíbrio progressivo entre essas formas e o meio” (Piaget)
-          conquistar o equilíbrio é função da inteligência.   

D) Operações Formais (4º estágio piagetiano) : 11/12 anos à idade adulta  
Característica: operações no plano das idéias (sem necessitar de manipulação ou referências concretas) = raciocina abstratamente

Os adolescentes se tornam conscientes de como o mundo poderia ser


Aquisições:
-    capacidade de lidar com conceitos de liberdade e justiça (especulações teóricas, científicas, morais, valorativas e ideológicas)
-    criar teorias sobre o mundo (refaz seu mundo, cria novos sistemas filosóficos, reforma as ciências)
-          capacidade de reflexão espontânea (refletir livremente)
-          tirar conclusões de puras hipóteses               

Livre exercício de reflexão:
-          (1º momento:) o adolescente submete o mundo real aos sistemas e teorias que seu pensamento é capaz de criar.
-          (2º momento:) concilia pensamento com a realidade: entende que a principal função da reflexão não é contradizer mas prever e a interpretar a experiência.

Relações sociais:
1)      inicialmente, fase de interiorização (aparentemente é anti-social)
-          o adolescente se afasta da família mas o alvo de sua reflexão é a sociedade (sempre analisada como passível de ser reformulada e transformada)
2)      posteriormente, equilíbrio entre pensamento e realidade
-          compreende que a reflexão serve para uma atuação no/sobre o mundo.
Exemplo: alguém com problema em matemática pensa, inicialmente, em tirá-la do curriculum escolar; posteriormente, propõe soluções mais viáveis, considerando as exigências sociais.

Afetividade:
-          o adolescente vive conflitos: quer independer-se do adulto mas depende dele.
-          Grupo de amigos: é seu referencial (uso de vocabulário, vestimentas e aspectos de seu comportamento)
-          Começa a estabelecer sua moral individual (referenciada à moral do grupo)

Estabilidade de interesses: acontece com a proximidade da vida adulta.
Conforme Piaget o início da formação da personalidade acontece entre 8/12 anos (período das operações concretas), quando se dá a organização autônoma das regras, dos valores e a afirmação da vontade. Estes aspectos subordinam-se num projeto único e pessoal, exteriorizando-se através da construção de um projeto de vida.
Projeto de vida (ou trajetória existencial):  norteará o indivíduo em sua adaptação ativa à realidade (preparação e inserção no mundo do trabalho), ocorrendo equilíbrio entre o real e os ideais do indivíduo.
 Os conflitos, dúvidas e atitudes imprevisíveis, próprios à personalidade do adolescente, são parte de um sistema mais amplo. Na visão de Piaget, a aquisição de uma nova habilidade mental – como as operações formais – provoca no adolescente um período de desequilíbrio, em que o mundo é captado pelo sujeito primordialmente através da assimilação egocêntrica (que se manifesta por uma crença ilimitada na capacidade de reflexão de atuar como instrumento de transformação da realidade).
Os jovens pensam e repensam sobre os mistérios do mundo, criando soluções que revolucionarão tudo até então visto.
“messianismo”: termo empregado por Piaget para caracterizar a adolescência: “o comprometimento do jovem em relação a uma determinada causa é integral”.
Ocorrência de paixões: ama-se por amar (ama-se a forma e não o conteúdo / ama-se a fantasia, não a realidade).
Individualidade: a percepção que tem agora de si afirma sua individualidade (que inclui em seu plano de vida a transformação da sociedade). A sociedade lhe parece injusta e desprezível, e nela ele não tem lugar.
Interação com outros jovens (e outros projetos de vida): volta-se para o outro. Idéia: trabalhar conjuntamente na reformulação da existência. O contato com a sociedade se torna fundamental, é preciso ganhar acesso, influência e poder para modificá-la.
O egocentrismo do adolescente é positivo: fundamental para que a personalidade do adolescente se desenvolva plenamente; e aos pouco harmoniza-se com a realidade.

Quanto à idade da vida adulta:
-          atualmente, o período da adolescência é cada vez maior.
-          Nenhuma nova estrutura mental é estabelecida nesta idade, apenas acontece o aumento gradual do desenvolvimento cognitivo, permitindo maior profundidade e compreensão dos problemas e das realidades que o atingem (influenciando os conteúdos afetivo-emocionais e sua forma de estar no mundo). 

  Se pensarmos no sucesso ou fracasso do rendimento intelectual de cada aluno numa sala de sexta-série do Ensino Fundamental percebemos que há um grande dilema sim...
            Há os que conseguem acompanhar uma aula de História com vários conceitos difíceis até para o professor transmitir, sem grandes dificuldades (segundo Piaget já estão na fase das operações formais), mas outras, não tem a facilidade de pensar em relacionar fatos que marcam nossa História atual com processos históricos do passado, nem conseguem projetar sua própria história de vida para os acontecimentos do futuro (estão ainda na fase das operações concretas). O professor convive com esses problemas diariamente em sala de aula...
            Já identifiquei e destaquei no início dessa pesquisa esses dois estágios de desenvolvimento cognitivo da criança, mas ainda é necessário tentar explicar,  quais as diferenças entre a Fase Operacional Concreta e a Fase Operacional Formal, pois assim posso identificar numa aula de demonstração sobre os “Antecedentes da Revolução Francesa (1789-1799)”, as crianças que se encontram numa ou noutra fase de desenvolvimento, com o propósito de pensar como posso (através de uma metodologia de trabalho diferenciada) chegar mais próximo de um rendimento homogêneo. Então, vamos ao que interessa?
“ A criança operacional concreta não apresenta a abrangência, o poder e a profundidade do raciocínio da criança mais desenvolvida. O raciocínio e o pensamento formal cognitivo emergem das operações concretas, da mesma forma que cada novo nível de pensamento incorpora e modifica os pensamentos anteriores. O pensamento formal tem como propriedades estruturais ser hipotético-dedutivo, científico-indutivo e reflexivo-abstrato”. (WADSWORTH, Pg. 109)
No período Formal, a criança passa a pensar os fatos e acontecimentos usando processos lógicos. A abstracção “aparece” e passa a funcionar como novo instrumento a auxiliar a forma de pensar da criança, o pensamento neste momento vai além do concreto. Além do uso da linguagem, a criança, portanto, passa a possuir novos elementos, novas ferramentas: A Lógica e a Abstracção, além de também apresentar o domínio da Reversibilidade. Essa passagem também é marcada pela capacidade de operar com o raciocínio Hipotético-dedutivo, tendo a possibilidade de raciocinar de forma a estabelecer relações entre o passado, o presente e o futuro, o que lhe permite o plausível enquanto hipótese, premissa, podendo ou não ser verdadeira.
   A criança nessa fase conquista também a possibilidade de operar com os raciocínios científico-indutivo e reflexivo-abstracto. Embora não seja algo fácil, passa a alcançar pelo uso do primeiro, usando efetivamente a razão, efectivas generalizações (do particular para o geral) a respeito dos fenômenos ou fatos observados e ainda reverter (Reversibilidade) esse processo, ou seja, permitindo-lhe ir do geral para o particular.

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